AP08
Família e política: territórios do vivido
É notável a centralidade das noções de família e suas múltiplas configurações em diversos e distintos contextos etnográficos, sobretudo no que diz respeito às análises desenvolvidas junto à comunidades tradicionais, sejam elas quilombolas, indígenas, ribeirinhas, ciganas, rurais. Famílias que fazem política(s), tecem cotidiano(s), articulando e produzindo territórios do vivido, desenhando modos de existência e resistência.
Há uma vasta produção na antropologia e sociologia sobre as conceituações de família e parentesco, transitando entre críticas à construção do objeto ‘família’ a partir de uma representação dominante, a família patriarcal, na qual a organização familiar é pensada somente como um componente agregado à ‘família’ nuclear patriarcal branca.
Almejamos, assim, no espaço deste Ateliê de Pesquisa, colocar em diálogo pesquisas que abordem a temática da família, construindo suas noções a partir de conceitos e categorias êmicas, visando colaborar com a discussão a partir das problematizações que as comunidades tradicionais nos apresentam, em seus territórios, vivências, modos de fazer e conceber a política e o político, na expectativa de romper com pensamentos e conceitualizações hegemônicas e estabilizadoras que corroboram com a diversa e crescente violência institucional que afligem estas comunidades.
Palavras-chave: Família; política; território.
Coordenação:
Lúnia Costa Dias (PPGAS/UFSC)
Thiago Santana (PPGAS/UFSC)
Debatedoras:
Edilma do Nascimento J. Monteiro (doutora em Antropologia PPGAS/UFSC)
Yara de Cássia Alves (PPGAS/USP)
Raquel Mombelli (NEPI/UFSC) (a confirmar)
Vanda Pinedo (Líder MNU/SC) (a confirmar)
Lista de Resumos Aprovados
Sessão 1 - 11 de outubro de 2019 – 8h30min às 11h30min
Família nação: maracatus e seu território cruzado
Charles Raimundo (UFSC)
O presente artigo visa colocar algumas questões que envolvem a nação de maracatu, que deve ser compreendida como lugar de família, encontro e orientação. É importante entendermos as sedes das nações de maracatu como um complexo físico e espiritual, colocando sob "seu teto" toda uma família de sangue e de santo, envolvendo diferentes gerações e agenciamentos. Encontrei no cruzamento terreiro/ sede da nação/ residência, o complexo ambiente em que o maracatu nação se desenvolve. Para exemplificar a ideia, tentarei especificar um pouco mais o que digo apresentando tais realidades e os vários ir e vir de Mestres, pessoas chave, neste complexo existencial.
Palavras chave:
A experiência da pessoa com deficiência no contexto quilombola – o lugar do parentesco.
Éber Santos da Silva (PPGAS/UFPR)
A pesquisa em andamento relaciona a experiência de pessoas com deficiência a suas vivências enquanto quilombolas em uma comunidade localizada no Estado do Paraná. O objetivo é compreender a construção da pessoa com deficiência a partir das relações nas quais estão inseridos e suas trajetórias na perspectiva dos próprios sujeitos. A deficiência assume relações diferentes nesse contexto, produzindo maneiras próprias na categorização dos sujeitos através de conceitos êmicos que marcam a relação com alguns parentes, no entanto a construção da pessoa tem lugar central no parentesco dando outra dimensão para deficiência articulando um conjunto de saberes, memórias e relações com o território que são o substrato dessas experiências. Diferentes sistemas explicativos e de categorização social (médico, religioso) também são acionados pelos sujeitos no que se refere a doenças e deficiência (que em muitos casos são vistos como a mesma coisa). A comunidade quilombola, enquanto um grupo constituído por parentes e pessoas relacionadas, diminui o papel do indivíduo e sua independência, enfatizando a
“coletividade”, assim a participação social da pessoa com deficiência está diretamente relacionado ao lugar que ocupa no grupo, a posição social na estrutura do parentesco, essa forma contrasta com algumas concepções modernas que pautam politicamente a deficiência que têm o valor de independência como um dos seus elementos centrais.
Palavras chave: deficiência – quilombos - parentesco
Futebol, Família e Conflito: uma experiência etnográfica com o Catanga Futebol clube
Marcos Paulo de Castro Mello (UFJF)
O presente trabalho buscou produzir um estudo etnográfico sobre a rivalidade entre duas torcidas de futebol de Passa Quatro, município da região sul de Minas Gerais. Trata-se de torcedores dos clubes do Catanga Futebol Clube que ao se identificarem e escolherem seu time para torcer, adentram em um universo de pertencimento. Nesse contexto, despertou-me a atenção à maneira como se constrói essa rivalidade, elemento que se tornou tão presente nas atividades rotineiras, evidenciando como o futebol produz questões importantes nas relações sociais. Amigos, entes queridos e familiares que se dividem entre os times rivais, vivem todo o processo ritual e performativo do futebol. É diante desse quadro que surge o objetivo do trabalho. Dentro dessa configuração futebolística, um lado ganha, enquanto outro perde, mas não se briga o tempo todo. Desse modo, não se é só torcedor de futebol, outros mecanismos são contemplados de maneira que a rivalidade vem sendo modulada enquanto algo que não é contínuo, uma noção de posição ativa onde esses torcedores controlam sua relações, administrando conflitos dentro deste universo esportivo. Uma dinâmica que opera como uma “navegação social”, um “saber viver” que busco entender aqui como o tempo do futebol, um momento especifico onde se constituem rearranjos sociais em torno da rivalidade, a partir da ideia de controle se produz um conflito autorizado que não promove uma ruptura das relações.
Palavras-chave: Futebol; família; controle;
Famílias transnacionais: as múltiplas e constantes diasporizações desencadeadas em contextos migratórios
Janaina Santos de Macedo (Prograd/UFSC)
O presente trabalho propõe uma reflexão construída a partir da articulação das narrativas, experiências e performances de famílias de migrantes haitianos e senegaleses que se deslocaram para a região da Grande Florianópolis a partir de 2010, temporária ou definitivamente. Através do trabalho etnográfico acompanhei, ao longo dos últimos anos, os modos como meus interlocutores e interlocutoras construíram suas trajetórias de mobilidade, como dialogaram com as diversas fronteiras físicas e simbólicas, local e transnacionalmente e como seus deslocamentos espaciais e também sociais contribuíram para deslocar saberes e práticas em sucessivas e constantes diasporizações. Aproximo os deslocamentos desde o Haiti e desde o Senegal através das conectividades e dissensos experimentados e produzidos por eles, através de sucessivas transformações e desestabilizações de tempos e espaços, procurando perceber como antigas práticas e crenças são ressignificadas, colocando pessoas e mundos em movimento através da articulação entre suas antigas experiências e aquelas vividas na diáspora, contribuindo para a criação de novos caminhos possíveis para suas famílias tanto no Brasil quanto nos seus países de origem. Desta forma as migrações, para além dos deslocamentos de pessoas, transformam modos de vida que impactam famílias transnacionalmente.
Palavras-chave: Migrações; Famílias; Diasporizações.
Entre Famílias e Festas: notas sobre política e comunidade no Quilombo de Pinhões
Lúnia Costa Dias (PPGAS/UFSC)
O presente trabalho propõe reflexões, ainda em curso, que desta maneira se apresentarão em formato de notas preliminares, em torno das articulações, atravessamentos, dinâmicas e experiências da feitura de famílias e festas nos modos de fazer política e comunidade no Quilombo de Pinhões. A proposta visa, assim, debruçar sobre os dados etnográficos produzidos ao longo dos anos de relação no Quilombo de Pinhões, desenvolvidos principalmente na dissertação de mestrado defendida em 2015 no PPGAN/UFMG, buscando compreender as potencialidades das relações possíveis entre a categoria êmica famílias raízes, que parece operar como sustentáculo da produção de narrativas históricas e a multiplicidade de festas promovidas e produzidas no Quilombo. Compreendemos as festas também como narrativas que versam de histórias e memórias em operação nos processos que constituem as famílias. Lançaremos mão assim na noção de narrativa para promover articulações entre os modos de feitura de famílias na dinâmica de produção das festas em sua diversidade e multiplicidade nos arranjos da política e da noção de comunidade.
Palavras chave: família; festas; narrativa; política
Família Quilombola: da invisibilidade ao racismo estrutural
Thiago da Silva Santana (PPGAS/UFSC)
Este trabalho declina-se sob o “Caso Gracinha e Suas Crianças”, ocorrido no Estado de Santa Catarina no ano de 2014, estendendo-se judicialmente até hoje. Maria das Graças de Jesus, a Gracinha, mulher negra e remanescente de quilombo teve suas filhas retiradas arbitrariamente do seu convívio social em novembro daquele ano; uma das crianças com três anos de idade e a outra com cinco, ambas levadas à adoção compulsória. As autoridades representantes do nosso judiciário responsáveis pela decisão pautaram suas justificativas legais em lógicas culturais racistas e classistas, não respeitando sequer o poder de família do direito prioritário à família extensa quilombola em casos de adoção. Para elucidar os fatos faço uma análise histórica, sociológica e antropológica com o intuito de compreender, dentro de uma dimensão interdisciplinar necessária para a resolução de conflitos familiares em comunidades tradicionais, quais os pressupostos ideológicos que influenciam diretamente no Direito brasileiro e no nosso judiciário que, assim como parte de nossa sociedade, deposita sua crença em um conceito antropológico ultrapassado; o famigerado e abjeto evolucionismo cultural. Com os resultados da pesquisa entendi que os diálogos entre o judiciário brasileiro e as comunidades quilombolas precisam de uma equiparação institucional, visto que o primeiro, aquele que tem o maior poder decisório e coercitivo, parte de uma ideia de progresso unilateral, eurocentrado e embranquecido, promovendo violências simbólicas e materiais aos grupos minoritários que correm o risco de verem seus discursos culturais, políticos e indenitários padecerem diante de seus esforços de resistência.
Palavras-chave: Antropologia do Direito, Racismo Institucional, Interdisciplinaridade, Direito de Família, Comunidades Tradicionais, Infância.